Cofre

Nº de referência da peça: 
F1285

Marfim, latão e prata
Ceilão, provavelmente Kandy, séc. XVI (2a metade)
Dim.: 8,0 x 19,0 x 11,0 cm
Prov.: Colecção dos Condes de Mesquitela / Duques de Albuquerque, Lisboa

Casket
Carved ivory, brass and silver
Ceylon (present-day Sri Lanka), probably Kandy, 2nd-half 16th century
Dim.: 8.0 x 19.0 x 11.0 cm
Prov.: Counts of Mesquitela / Duques de Albuquerque collection, Lisbon

This important casket belongs to a restricted group of carved ivory furniture, fall-front writing boxes and other caskets made in 16th century Ceylon for the highest Portuguese hierarchy, few of which remain in private hands.
Rectangular in shape and resting on a stepped projecting base, the casket is assembled by four dovetail joined ivory plaques, reinforced by brass pins and fitted with a flat cover and base plate consisting of two ivory half lap splice joined sections.
All the visible outer surfaces are profusely carved in low-relief with scrollwork and mythological beasts, most notably lions or siṁha, heraldic symbol of Ceylon’s Royal House. On the front elevation, facing each other on either side of the silver lock plate, a makarā-headed siṁha confronts the siṁha on the right. And while the lateral elevations depict makarā-headed horned deer, the back panel features a gajasiṁha - elephant-headed lion - and two distinct types of makarā-headed siṁha. The cover, fitted with a silver loop handle of makarā head terminals, is decorated with two wide scroll bands with lotus flowers, encircling eight individually headed siṁha.
The sophisticated silver lock mechanism, revealing the exceptional mastery reached by 16th century Ceylonese silverwork, consists of an architectural latch terminal shaped as a makarā - aquatic monster that protected the casket valuable contents - and a square-shaped escutcheon that reflects types commonly seen in Renaissance Europe.
Produced in Ceylon’s Royal workshops during the 2nd-half of the 16th century the present casket belongs to a very small group of analogous objects, of which two, originally gifts by the 1542 Ceylonese Embassy to Lisbon, are now in Munich. Both of these caskets stand out for their unparalleled workmanship, size and high-relief figural decoration. Undoubtedly made by master ivory carvers at the Imperial Kōṭṭe workshops, their production could have been directly overseen by King Bhuvanekabāhu VII (r. 1521-1551) and his Brahmin chaplain, Śrī Rāmarakṣa Pandiṭa, who served as Kōṭṭe’s ambassador to Lisbon.
Mounted in gold and set with rubies and sapphires, these objects were produced by highly skilled and accomplished gem cutters, goldsmiths and ebony and ivory carvers or cabinet makers, devoted to producing such masterpieces. Following from Kōṭṭe’s destruction in 1565 and the craftsmen resettlement in Portuguese-ruled Colombo, the highly refined carving technique achieved in earlier caskets, was probably lost. Yet, it becomes clear that, as in Europe, talented artists moved from one court to another, in search of superior artistic and cultural patronage.
The present casket, modelled after a late medieval European prototype, was produced in a period of Ceylon's history marked by wars and internal conflict, as well as by the rise and fall of rulers within the various kingdoms, in which the precedence of South Indian, Tamil artistic traditions over local Buddhist aesthetics, and vice-versa, was never static.
Identical low-relief carving and larger-scale faunal and floral motifs of Tamil origin are also identifiable in a group of extant objects, of which a fine example, a casket of identical decorative repertoire probably produced in Kandy in the Ceylonese central highlands, belongs to the Távora Sequeira Pinto collection at Oporto. The fact that Rājasiṁha I (r. 1581-1593), King of Sītāvaka and of Kandy until 1592, at the time the most powerful ruler in the island, gave preference to South Indians and even converted to Hinduism, makes it easier to understand this artistic shift. The precise production centre for these works has been disputed in recent historiography, somehow forcing upon them the idea that they might have been produced next to or within European-ruled centres such as Colombo or Galle. While this is certainly true for 17th century furniture pieces produced for exporting, it seems unlikely for earlier diplomatic gifts given the island’s political and artistic context.
Other similar pieces from within this restricted group, with strong South Indian characteristics and featuring analogous low-relief carved decoration combined with engraved foliage friezes, identical shape and flat tops, are also known, namely one at the Victoria and Albert Museum, London (inv. 205-1879), and another, originally in King Fernando II’s of Portugal (1816-1885) collection and recently acquired by the Asian Civilizations Museum in Singapore. Alongside the Oporto casket, a recently published prismatic cover casket of this same group is also recorded in a Lisbon private collection.
Until recently, the casket herewith described belonged to the Counts of Mesquitela family. In 1886, by a royal decree signed by King Luís I (r.1861-1889), the 2nd Count of Mesquitela, João Afonso da Costa de Sousa de Macedo (1815-1890) was given the title of 1st Duke of Albuquerque, on the grounds that the family were direct descendants of Afonso de Albuquerque (1453-1515), the 2nd viceroy of Portuguese India and a major figure of the Portuguese overseas expansion, responsible for establishing Portugal as a major potency in South and Southeast Asia.

Este muito importante cofre, faz parte um raro grupo de peças em marfim entalhado, cofres e escritórios de tampo de abater, produzidas no Ceilão no século XVI para portugueses de elevada condição, sendo um dos muito poucos exemplares ainda em mãos privadas.
De forma rectangular, esta arqueta apresenta tampa plana assentando sobre supedâneo saliente. O corpo é constituído por quatro placas de marfim ensambladas em cauda de andorinha fixas por pinos metálicos. Duas placas formam a tampa, assim como a base, sabiamente ensambladas em junta plana de encaixe “a meia-madeira”
À excepção do fundo, todas as placas são profusamente entalhadas em baixo-relevo com enrolamentos vegetalistas emoldurando animais mitológicos, nomeadamente o animal heráldico da Casa Real do Ceilão, o leão ou siṁha.
Na frente, dois siṁha afrontados flanqueiam o escudo da fechadura, o da esquerda com cabeça de makarā. Nas ilhargas estão representados veados com hastes e cabeça de makarā e o tardoz está decorado com um gajasiṁha (um leão com cabeça de elefante) e dois tipos diferentes de siṁha com cabeça de makarā.
A tampa - com pega em prata com terminais em forma de makarā - é decorada por dois largos frisos de enrolamentos vegetalistas com flores-de-lótus emoldurando oito tipos de siṁha com diferentes cabeças.
As montagens de prata evidenciam bem a qualidade da prataria cingalesa do século XVI. O terminal da lingueta, de natureza arquitectónica, é em forma de makarā - mostro aquático que protege os valores no interior do cofre - enquanto o escudete quadrado replica um modelo da Europa do Renascimento.
Este cofre pertence a um muito reduzido grupo de objectos idênticos produzidos nas oficinas régias cingalesas, em meados e na segunda metade do século XVI. Destes, dois estão agora em Munique, tendo sido trazidos para Lisboa pela embaixada cingalesa em 1542 e que se destacam pela sua inigualável qualidade técnica e artística, dimensão e decoração entalhada em alto-relevo com figuras. Seguramente produzidos por mestres entalhadores de marfim nas oficinas régias da cidade imperial de Kōṭṭe, a sua excução terá sido provavelmente supervisionada directamente pelo rei Bhuvanekabāhu VII (r. 1521-1551) e seu capelão brâmane, Śrī Rāmarakṣa Pandiṭa, que serviu como embaixador de Kōṭṭe em Lisboa. Com montagens em ouro cravejadas de rubis e safiras, tais objectos foram certamente criados como obra colectiva nas oficinas régias, onde mestres lapidários, ourives e entalhadores de ébano e marfim ou marceneiros - todos pertencentes à categoria de artífices régios - trabalhavam para produzir tais obras-primas. Após a destruição da cidade capital de Kōṭṭe em 1565, com a possível transferência destes artesãos para a Colombo sob tutela lusa, a técnica de entalhe em alto-relevo altamente refinada dos primeiros cofres ter-se-ia perdido embora, tal como na Europa, os mais talentosos artistas devam ter transitado de uma corte para outra, em busca de mais alto patronato artístico e cultural.
Este cofre, copiando protótipo europeu medieval, foi produzido num período da história do Ceilão marcado por guerras e conflitos internos, que viu a ascensão e queda de diversos personagens como governantes de diferentes reinos na ilha, onde a precedência sul indiana, isto é, das tradições artísticas tâmil sobre a estética budista local e vice-versa nunca foram estáticas.
O mesmo tipo de entalhe em baixo-relevo e motivos de grande escala (fauna e flora) de origem tâmil é manifesto em alguns objectos sobreviventes dos quais um bom exemplo - com repertório decorativo semelhante - pertence à colecção Távora Sequeira Pinto no Porto, e que terá sido produzido em Kandy, nas terras altas do centro do Ceilão.
Quando sabemos que Rājasiṁha I (r. 1581-1593), rei de Sītāvaka e de Kandy até 1592, o mais poderoso governante da ilha neste período, deu preferência a indianos do sul do subcontinente durante o seu reinado, chegando mesmo a converter-se ao hinduísmo, torna-se fácil compreender tal transformação artística.
O exacto centro de produção destas obras tem sido contestado por alguns que procuram impor, como local de produção, centros sob domínio europeu ou no seu entorno, como Colombo ou Galle. Embora seja certamente verdade para as peças de mobiliário do século XVII executadas sob encomenda europeia para exportação, parece improvável em relação a objectos mais recuados, produzidos para oferta diplomática, dado o contexto político e artístico da ilha.
De outras peças semelhantes, com características distintivas do sul da Índia, e apresentando o mesmo tipo de decoração - entalhada em baixo-relevo e com frisos vegetalistas incisos - são de referir duas caixas rectangulares, com tampos planos, e que também copiam protótipos europeus. Um pertence ao Victoria and Albert Museum, Londres (inv. 205-1879), enquanto a outra, que fez parte da colecção do Rei D. Fernando II (1816-1885) - sobrevivendo por herança nos descendentes da Condessa d’Edla - foi recentemente adquirida pelo Asian Civilizations Museum, Singapura. Para além destes dois, e do cofre no Porto já referido, um outro de tampa prismática foi recentemente publicado e pertence agora a uma colecção particular de Lisboa.
O cofre aqui descrito pertenceu até recentemente à colecção dos Condes de Mesquitela. D. João Afonso da Costa de Sousa de Macedo (1815-1890) - 2.º Conde de Mesquitela - no dia 19 de Maio de 1886 por decreto régio, foi feito 1.º Duque de Albuquerque pelo rei D. Luís I (r. 1861-1889). Na base esteve o facto dos Condes de Mesquitela serem os descendentes directos de Afonso de Albuquerque (1453-1515) e 2.º Governador do Estado Português da Índia e figura bem conhecida da Expansão Portuguesa e do estabelecimento dos portugueses no sul da Ásia e Insulíndia.

Hugo Miguel Crespo

  • Arte Colonial e Oriental
  • Artes Decorativas
  • Marfim, Tartaruga e Madrepérola

Formulário de contacto - Peças

CAPTCHA
This question is for testing whether or not you are a human visitor and to prevent automated spam submissions.
Image CAPTCHA
Enter the characters shown in the image.