Prato, 1600-1620
Raríssimo prato de faiança portuguesa dos inícios do século XVII proveniente das olarias de Lisboa, ornamentado com vibrante pintura a azul-cobalto sobre o esmalte estanífero branco.
O fundo está centrado em uma cabaça, envolta numa linha serpenteada e inserida em moldura quadrada de filetes livres a partir do qual se desenvolve uma decoração com elementos geométricos de cariz islâmico, que se estende pelo covo até ao bordo.
A decoração da aba é bastante elaborada e está dividida em quatro reservas circulares, equidistantes, com flor geometrizada ao centro, semi-circundadas por trapézio de feição isósceles - que se prolonga pelo covo do prato e cuja base é um dos lados do quadrado central - preenchido por quatro trapezoides ocupados por riscos paralelos. Por sua vez, os círculos alternam com o mesmo número de cartelas - em forma de arcos polilobados que se estendem pelo covo, terminando nos vértices da moldura central do prato - sobre um fundo reticulado, e adornadas com espirais ao centro. O verso do prato está ornado com dezoito reservas com um “S” inscrito, copiando, de forma rudimentar, uma prática utilizada nas peças chinesas desta época.
Modelo característico do período de “Decoração Geométrica” alia a influência ornamental da porcelana chinesa, que chegava aos portos portugueses através do comércio com o oriente, à gramática decorativa islâmica, estabelecida em território luso por via da cerâmica Levantina espanhola e italiana, principalmente de Montelupo e Veneza.
Especifico da linguagem “islamizante” de produção nacional é o preenchimento obsessivo do espaço - horror vacui – com pequenos elementos de pintura solta, mas contida em reservas, muitas vezes assimétricas, de contornos diversos em complexas composições geométricas que preenchem a aba e extravasam para o covo, oprimindo o tema central. Entre elas destacamos as espirais, que se agrupam em cartelas pseudo-geométricas, e que são ornamentos frequentes na cerâmica lusa do final do Quinhentos e princípios do século seguinte.
Para além da cores azul e branca, análogas à porcelana chinesa, a faiança portuguesa deste período integra a gramática decorativa china, que os oleiros lusos mimetizam a seu modo sem perceberem o conteúdo simbólico que lhe está adjacente. Exemplo dessa reprodução é a “cabaça” retratada no fundo deste prato. Esta forma surge com grande profusão no período Jiajing (1521-1567), como atributo de Li Tieguai, um dos oito imortais taoistas. Nela se contêm todos os elixires mágicos que afastam os maus espíritos e a doença, apresentando, assim, uma conotação forte com a longevidade. Para o artífice lisboeta que copia a cabaça, esta tem um carater unicamente decorativo e, chega mais longe, ao envolve-la numa espiral que na origem corresponde às laçarias utilizadas nos objectos preciosos chineses.
Esta atribuição cronológica (1600-1620) aos modelos de “Decoração Geométrica” baseia-se em paralelismos de peças datadas deste período e em achados arqueológicos, identificados, não apenas em Portugal, mas noutros países, nomeadamente nos Países Baixos, ilhas Britânicas e área geográfica da Liga Hanseática. Em vários pontos desta geografia surgiram exemplares de origem portuguesa cujas características, quando confrontadas com outras da mesma época e proveniência, apontam para os mesmos traços específicos de decoração. São exemplos interessantes deste período, as peças exumadas em Deventer e Dordrecht, nos Países Baixos, em contextos datados de 1580-1620[1]. Em Amesterdão na zona de Waterlooplein foram encontrados alguns exemplares com as cotas de desenterramento entre 1600 e 1620[2]. Também peças de faiança portuguesa com a mesma decoração foram recolhidas em Carrickfergus, na Irlanda, e ainda um prato exumado em Londres, em St. James Passage Subway, integralmente encontrados, num período de deposição que não ultrapassa o ano de 1620[3].
A raridade deste prato está na qualidade da pasta e o vidrado estanífero bem preservado assim com a intensidade da cor azul-cobalto e beleza decorativa, mas também na proveniência inglesa, que revela o quanto a moda da faiança portuguesa ultrapassa fronteiras e épocas.
[1] Michiel Bartels, “Cerâmica Portuguesa nos Países Baixos, uma análise social-económica baseada em achados arqueológicos” in Património Estudos (Instituto Português do Património Arquitectónico) nº 5, 2003, pp. 74 e 75.
[2]Jan Bart, Rafael Salinas Calado, “Faiança portuguesa escavada no solo de Amesterdão”, 1987, pp. 78-80.
[3] Tânia Manuel Casimiro, “Faiança portuguesa: datação e evolução crono-estilistica” in Revista Portuguesa de Arqueologia, vol. 16, 2013, p. 356.
Raríssimo prato de faiança portuguesa dos inícios do século XVII proveniente das olarias de Lisboa, ornamentado com vibrante pintura a azul-cobalto sobre o esmalte estanífero branco.
O fundo está centrado em uma cabaça, envolta numa linha serpenteada e inserida em moldura quadrada de filetes livres a partir do qual se desenvolve uma decoração com elementos geométricos de cariz islâmico, que se estende pelo covo até ao bordo.
A decoração da aba é bastante elaborada e está dividida em quatro reservas circulares, equidistantes, com flor geometrizada ao centro, semi-circundadas por trapézio de feição isósceles - que se prolonga pelo covo do prato e cuja base é um dos lados do quadrado central - preenchido por quatro trapezoides ocupados por riscos paralelos. Por sua vez, os círculos alternam com o mesmo número de cartelas - em forma de arcos polilobados que se estendem pelo covo, terminando nos vértices da moldura central do prato - sobre um fundo reticulado, e adornadas com espirais ao centro. O verso do prato está ornado com dezoito reservas com um “S” inscrito, copiando, de forma rudimentar, uma prática utilizada nas peças chinesas desta época.
Modelo característico do período de “Decoração Geométrica” alia a influência ornamental da porcelana chinesa, que chegava aos portos portugueses através do comércio com o oriente, à gramática decorativa islâmica, estabelecida em território luso por via da cerâmica Levantina espanhola e italiana, principalmente de Montelupo e Veneza.
Especifico da linguagem “islamizante” de produção nacional é o preenchimento obsessivo do espaço - horror vacui – com pequenos elementos de pintura solta, mas contida em reservas, muitas vezes assimétricas, de contornos diversos em complexas composições geométricas que preenchem a aba e extravasam para o covo, oprimindo o tema central. Entre elas destacamos as espirais, que se agrupam em cartelas pseudo-geométricas, e que são ornamentos frequentes na cerâmica lusa do final do Quinhentos e princípios do século seguinte.
Para além da cores azul e branca, análogas à porcelana chinesa, a faiança portuguesa deste período integra a gramática decorativa china, que os oleiros lusos mimetizam a seu modo sem perceberem o conteúdo simbólico que lhe está adjacente. Exemplo dessa reprodução é a “cabaça” retratada no fundo deste prato. Esta forma surge com grande profusão no período Jiajing (1521-1567), como atributo de Li Tieguai, um dos oito imortais taoistas. Nela se contêm todos os elixires mágicos que afastam os maus espíritos e a doença, apresentando, assim, uma conotação forte com a longevidade. Para o artífice lisboeta que copia a cabaça, esta tem um carater unicamente decorativo e, chega mais longe, ao envolve-la numa espiral que na origem corresponde às laçarias utilizadas nos objectos preciosos chineses.
Esta atribuição cronológica (1600-1620) aos modelos de “Decoração Geométrica” baseia-se em paralelismos de peças datadas deste período e em achados arqueológicos, identificados, não apenas em Portugal, mas noutros países, nomeadamente nos Países Baixos, ilhas Britânicas e área geográfica da Liga Hanseática. Em vários pontos desta geografia surgiram exemplares de origem portuguesa cujas características, quando confrontadas com outras da mesma época e proveniência, apontam para os mesmos traços específicos de decoração. São exemplos interessantes deste período, as peças exumadas em Deventer e Dordrecht, nos Países Baixos, em contextos datados de 1580-1620[1]. Em Amesterdão na zona de Waterlooplein foram encontrados alguns exemplares com as cotas de desenterramento entre 1600 e 1620[2]. Também peças de faiança portuguesa com a mesma decoração foram recolhidas em Carrickfergus, na Irlanda, e ainda um prato exumado em Londres, em St. James Passage Subway, integralmente encontrados, num período de deposição que não ultrapassa o ano de 1620[3].
A raridade deste prato está na qualidade da pasta e o vidrado estanífero bem preservado assim com a intensidade da cor azul-cobalto e beleza decorativa, mas também na proveniência inglesa, que revela o quanto a moda da faiança portuguesa ultrapassa fronteiras e épocas.
[1] Michiel Bartels, “Cerâmica Portuguesa nos Países Baixos, uma análise social-económica baseada em achados arqueológicos” in Património Estudos (Instituto Português do Património Arquitectónico) nº 5, 2003, pp. 74 e 75.
[2]Jan Bart, Rafael Salinas Calado, “Faiança portuguesa escavada no solo de Amesterdão”, 1987, pp. 78-80.
[3] Tânia Manuel Casimiro, “Faiança portuguesa: datação e evolução crono-estilistica” in Revista Portuguesa de Arqueologia, vol. 16, 2013, p. 356.
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