Pulseira Edo , Reino do Benim, Nigéria / Kingdom of Benin, Séc. XVII-XVIII
Further images
Raro e importante bracelete em latão fundido, provavelmente de um par, destinado a um alto nobre ou régulo da corte dos reis do Benim, e produzido na capital, Edo (na actual Nigéria, hoje Benin City), provavelmente durante o século XVII.
Produzido segundo a técnica da cera perdida, este bracelete apresenta uma composição em módulo cujo motivo principal é a representação icónica de um português, provavelmente um oficial ou soldado quinhentista, vestindo gibão e colete com seus botões proeminentes, calças curtas golpeadas e chapéu redondo, com as mãos à altura das ancas segurando na direita o que parece ser uma espada.
Utilizadas neste tipo de objecto cerimonial, as figuras de portugueses são uma representação alegórica, dado que os estrangeiros, vindos das águas e de certa forma ligados à divindade do mar Olokun (simbolizado pela cor branca), eram considerados figuras protectoras, quase mágicas e talismânicas, associadas ao grande rei-guerreiro do século XVI, o oba Esigie (r. 1504-1547) que contou com soldados portugueses na guerra contra o ata (ou rei) do reino de Idah, reino que incorporou ao seu.
As figuras de portugueses, invariavelmente representados com narizes aduncos, e olhos proeminentes e amendoados, surgem, ora em posição vertical, ora invertidos (como se de um padrão se tratasse), sobre fundo vazado de encordoado duplo e espirais filiformes aos pés e a ladear a cabeça de cada figura. São também de entrançado os limites, superior e inferior do bracelete, ponteados em intervalos regulares por argolas (em número de três) das quais, à semelhança das argolas do centro de cada espiral, penderiam guizos, hoje perdidos.
O aspecto filiforme da representação, do entrançado e das espirais, advém do processo de fabrico, que consiste na modelação com rolinhos de cera de espessura regular, resultando num positivo integralmente em cera, trabalhado depois com estilete, e do qual era tirado o molde em gesso ou negativo, para dar origem ao positivo em metal fundido. Tal como se observa noutros exemplares remanescentes, as operações posteriores à fundição resumiram-se à eliminação dos canais de alimentação (ou de entrada do metal em estado líquido) e de respiro e saída do ar, subsistindo intactos todos os excessos de metal junto aos motivos vazados.
A par das fiadas e colares rígidos, adereços de cabeça e vestuário - integralmente feito com malha reticulada de contas de coral vermelho, conhecidas por ivie ebo ou “contas europeias”, uma vez que o Coralium rubrum do Mediterrâneo foi introduzido no reino do Benim pelos mercadores portugueses; elas traduziam pela cor, o sangue e o perigo, mas eram principalmente símbolo de poder e sinal de riqueza, pelo seu valor - tecidos ricos, ornamentos em latão usados à cintura e demais regalia, o oba (ou rei) e outros chefes do Benim, usavam (e ainda usam) nas solenidades palacianas, pares de braceletes longos e de forma cilíndrica, colocados nos pulsos e usados durante a dança ritual, com espada cerimonial (eben), por forma a impedir que as contas se emaranhassem enquanto o rei brandia a espada.
Feitas sempre de marfim entalhado - de uso exclusivo reservado ao rei, à excepção dos reinados politicamente mais brandos -, a par de braceletes ebúrneos do oba correspondia semelhante par feito em latão, quer fundido quer martelado, usado pelos nobres da corte para arremessar repetidamente o eben durante o festival anual de Igue - celebrado em Dezembro - e em que se comemorava a renovação dos poderes mágicos do oba Ewuare (r. 1440-1473) ou, segundo outras tradições, o matrimónio do oba Ewuare com Ewere.
Estes braceletes de latão, uma liga de cobre e zinco - erradamente identificado como bronze (liga de cobre e estanho), à semelhança das placas que adornavam o palácio do oba -, eram encomendados à corporação dos fundidores ou Igun Eronmwon.
Existem no British Museum, em Londres, alguns exemplares produzidos por fundição em cera perdida - à semelhança do nosso exemplar -, embora com decoração exclusivamente de carácter geométrico, sendo dois de decoração em bandas, com reticulado vazado alternando com friso de espirais (inv. no. Af1920,1106.12 e Af1947,18.50), ambos muito semelhantes ao presente no encordoado do bordo superior e inferior, e com argolas para suspensão de guizos; um terceiro, igualmente em bandas, com reticulado intercalado com entrançado largo de seis fios (inv. no. Af1954,23.360); e um outro, dividido em cinco registos horizontais com entrançados complexos de três fios. Combinando o reticulado vazado com figuras de portugueses, embora claramente de produção descuidada e onde a representação dos portugueses é já plenamente icónica e abstracta, refira-se um bracelete já oitocentista outrora da colecção Perls, e hoje no Metropolitan Museum of Art, em Nova Iorque (inv. no. 1991.17.150).
Provenance
Col. Jacques Kerchache e Rui QuintelaPublicações
Sotheby'sReceba as novidades!
* campos obrigatórios
Processaremos os seus dados pessoais que forneceu de acordo com nossa política de privacidade (disponível mediante solicitação). Pode cancelar a sua assinatura ou alterar as suas preferências a qualquer momento clicando no link nos nossos emails.