Frei de Santo António Vilaça Mestre
Par de Esculturas do Convento de Pombeiro , Portugal, séc. XVIII
Carvalho
Alt.: 182.0 e 170.0 cm
F1361
Further images
Provenance
José Lopes, Lisboa
Duas esculturas de vulto inteiro, de madeira de castanho-dourada e policromada, representando santas, provavelmente as irmãs de Santa Quitéria . Originalmente provenientes do coro do mosteiro da ordem de São Bento de Santa Maria do Pombeiro, situado na região de Entre Douro e Minho, no município de Felgueiras, terão sido executadas no último quartel do século XVIII. A sua autoria foi atribuída a Frei José de Santo António Ferreira Vilaça (1731 – 1809) pelo professor e historiador de arte norte-americano Robert C. Smith (1912 – 1975). Ferreira Vilaça, escultor e entalhador da ordem beneditina, é considerado um dos mais influentes e profícuos mestres do rococó minhoto, tendo trabalhado, não só para os mosteiros da sua ordem, mas também para outros encomendadores da região. As imagens em apreço medem Fig. A -1,80m; Fig. B - 1,65 m. Faziam parte de um conjunto de quatro, que saíram do mosteiro e foram vendidas a um antiquário da Póvoa do Varzim. Apresentam as características estilísticas das obras escultóricas femininas de Ferreira Vilaça, nas quais se destacam os corpos robustos, os longos torsos, os rostos de narizes afilados e compridos, os olhos amendoados e as testas altas, apresentando semelhante modelação dos lábios superiores e orelhas. Apesar de todas estas similitudes serem facilmente reconhecidas entre as estátuas mencionadas, a definitiva, segundo Robert Smith, será a característica modelação dos seus revoltos cabelos, apanhados no alto da cabeça. Outro pormenor que as irmana é a opção semelhante pelo tipo de vestuário que ostentam. Vestem trajes ondulantes, de complexas pregas, algumas com corpetes subidos, mangas trabalhadas, todo o conjunto pontuado por elementos como cintos com laços, flores, franjas e galões, que lhes emprestam opulência, requinte e sentido de movimento. Embora, as opções de indumentária apresentem genericamente estas particularidades, é de salientar que as estátuas variam entre si as preferências dos elementos decorativos aplicados aos seus trajes. Estas imagens são comparáveis às seis que frei José esculpiu para as caixas dos dois órgãos da igreja do mosteiro beneditino de São Miguel de Refóios de Basto, município de Cabeceiras de Basto, Braga e ainda à pequena imagem da Virgem Menina entre Santa Ana e São Joaquim, pertencente ao mosteiro de São Martinho de Tibães, em Braga. Esta figuração de Maria replica em tudo, mas em modelo miniaturizado, as características plásticas das grandes estátuas em apreço. Os mesmos traços fisionómicos, a rica roupagem e os cabelos delicadamente apanhados testemunham a sua pertença a este conjunto, de que só a sua pequena dimensão destoa. Embora não seja possível avançar com certeza quais a invocação das imagens oriundas do mosteiro de Pombeiro, coloca-se a hipótese de fazerem parte de um conjunto escultórico, que representava Santa Quitéria e as suas oito irmãs gémeas. A ausência de elementos iconográficos, que permitiria atribuir-lhes personalidade mais certa, pode ser de alguma forma compensada por certos indícios. Desde logo, são figuras femininas, que sugerem ter segurado nas mãos algum tipo de objeto, provavelmente palmas de martírio. Para além disso, sabe-se que nas imediações do mosteiro de Pombeiro, em Felgueiras, existia um antigo santuário cuidado pelos beneditinos e dedicado a esta santa, devoção arreigada na região minhota. Estas informações, a par daquelas que confirmam a presença de estatuária de vulto no coro da igreja do antigo cenóbio, poderão contribuir para vincular estas esculturas ao espaço da igreja do mosteiro ou primitivamente ao do santuário dedicado a Santa Quitéria .A história contemporânea destas estátuas insere-se naquela mais alargada que remonta à desamortização dos bens dos mosteiros e conventos em Portugal, por decreto de 1834. Arrestados e, por vezes, vendidos, os bens imóveis e grande parte dos móveis destes espaços religiosos, em que se incluem a talha e a escultura em madeira, conheceram fortuna errante. Neste caso específico do mosteiro do Pombeiro, sabe-se que o espaço da antiga igreja monacal foi mantido e que as estátuas e demais talha e imaginária foram por lá permanecendo.O conjunto de quatro imagens, de que faziam parte estas duas, foi comprado pelo cineasta e cenógrafo Leitão de Barros (1896 – 1967), a fim de as colocar na Nau S. Vicente, que construía com o apoio do Estado e de diversos empresários portugueses e brasileiros. A nau, mimetizando uma embarcação portuguesa do século XVII, deveria funcionar como um mostruário navegante dos produtos de excelência produzidos em Portugal. Desde o azeite, aos vinhos, nos quais se incluía naturalmente o do Porto, ao café produzido nas então colónias, à ourivesaria, à cerâmica e aos produtos da região da Ilha de Madeira, entre outros, era a excelência da produção comercial portuguesa que deveria percorrer o Atlântico e aportar, preferencialmente, no Brasil e nos EUA. A ideia de construção da Nau S. Vicente surge na sequência do desmantelamento da Nau Portugal, cuja decoração interior foi concebida pelo mesmo Leitão de Barros para tomar parte na Exposição do Mundo Português, de 1940, ficando também conhecida como “O Pavilhão do Mar” . Esta nau tinha por destino último a navegação pelo Atlântico, levando a terras do Brasil e EUA o conhecimento e venda de produtos regionais portugueses. Como a Nau Portugal nunca esteve operacional para navegar, devido a erros de cálculo de engenharia naval, e acabou por sucumbir nas docas de Belém ao grande ciclone de 1941, que lhe retirou qualquer hipótese de sobrevivência, o seu destino nunca foi cumprido. Ornada por diversas estátuas e talha dourada oriunda de mosteiros, conventos e igrejas do país, foi grandemente elogiada pelos seus interiores opulentos e representativos das artes da talha e escultura dos séculos XVII e XVIII. Leitão de Barros nunca desistiu do seu sonho de lançar ao Tejo uma embarcação réplica dos galões da carreira da Índia, cenograficamente decorada com peças de talha e imaginária barroca. Nasce assim o projeto da Nau S. Vicente e a procura por peças escultóricas barrocas, que pudessem demonstrar a excelência de uma herança patrimonial, que o Estado Novo começava a exaltar, em grande parte por ação de historiadores de arte estrangeiros como Robert C. Smith, ou o conservador do museu do Louvre, Germain Bazin (1901 – 1990). Quanto às grandes estátuas de santas adquiridas por Leitão de Barros ao antiquário da Póvoa do Varzim, estavam destinadas a decorar a popa do navio, enquanto grandes anjos adultos tomariam lugar à proa. Estas escolhas são em tudo semelhantes àquelas que fez na decoração da Nau Portugal, quando destacou para aqueles mesmos locais do navio figuras escultóricas barrocas agigantadas . Depois de grandes investimentos e envolvimento pessoal de Leitão de Barros, o projeto foi gorado por falta de financiamento: o Estado português acabou por retirar o seu apoio com a justificação dos custos elevados e insuportáveis da ambiciosa empreitada. Após este desaire, todo o recheio destinado a ornar os interiores da Nau conheceu destinos díspares. Quanto à escultura de vulto e talha dourada, sabe-se que foram sendo vendidas depois da morte do cineasta, em 1967. Sobre este assunto, existe uma reportagem emitida pela RTP1, a seis de junho de 1973, que documenta o leilão de objetos de arte pertencentes a Leitão de Barros, no qual se observam várias peças de talha, entre as quais provavelmente ainda se contavam algumas destinadas a decorar a Nau S. Vicente .Quanto às quatro estátuas de santas, conheceram destino semelhante às demais peças de maior valor artístico deste espólio: a venda a compradores interessados em estatuária barroca.Numa carta datada de 15 de agosto de 1967, endereçada ao historiador de arte Flávio Gonçalves (1929 – 1987), Robert Smith, chamado para as identificar e avaliar, refere:“A respeito das imagens de Leitão de Barros, sei que já em Abril estavam para vender, porque o senhor que me levou ao atelier mandou um telegrama perguntando qual preço devia pedir. Eu disse 30 contos cada imagem! Respeito pelo monge” .
1
of
6
Join our mailing list
* denotes required fields
We will process the personal data you have supplied in accordance with our privacy policy (available on request). You can unsubscribe or change your preferences at any time by clicking the link in our emails.