Escritório em Marfim e Tartaruga , India Mogol, séc. XVII
teca, tartaruga, marfim e prata
21,5 x 33 x 25 cm
F1095
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Exuberante escritório de pequenas dimensões em tartaruga, marfim e osso, produzido no norte da Índia, provavelmente em Guzarate, seguindo os modelos europeus de finais do século XVI[1], destinado ao consumo europeu.
Construído em teca coberta com folha de ouro, o escritório é integralmente revestido por placas polidas de carapaça mosqueada de tartaruga, provavelmente da tartaruga-de-escamas ou tartaruga-de-pente (Eretmochelys imbricata), atendendo às manchas acastanhadas sobre um fundo translúcido alaranjado[2]. As placas são fixas à estrutura por cavilhas, em tartaruga, com molduras em osso, também com o mesmo tipo de fixação.
Em cada face, a placa central é retangular, limitada por friso com reticulado geométrico em osso, teca e ébano, delimitado por banda mais larga em osso. Encontra-se envolvida por oito placas também retangulares, separadas por filetes de osso. A composição termina em moldura em osso, ébano e teca, desenhando reticulados cadenciados, com filete em osso periférico. O tardoz, embora com o mesmo tipo de decoração, difere no número de placas de tartaruga e sua disposição (10).
O interior da tampa de abater possui uma decoração semelhante às anteriores. O escritório apresenta sete gavetas, simulando nove, de dimensões variáveis, distribuídas por três níveis e que se subdividem, no seu interior. As frentes são decoradas com placas de tartaruga, e os entrepanos revestidos a filete de osso. As placas de tartaruga estão emolduradas por cercaduras de osso e ébano, tendo cantoneiras em osso e os puxadores, em formato de botão, do mesmo material. São exceção o gavetão superior e a pequena gaveta mediana do renque inferior.
No interior dos compartimentos, as arestas são decoradas com o mesmo tipo de cantoneira em osso.
As ferragens, em prata, incluem o espelho de fechadura recortado e gravado com decoração floral, cantoneiras em prata recortada e gravada com flores-de-lis fixas por balmázios de prata, dobradiças, bem como gualdras laterais nas ilhargas.
Escritórios semelhantes foram produzidos na Índia, em Guzarate e noutros centros de produção ao longo da costa ocidental indiana, e no Ceilão (atual Sri Lanka). Guzarate foi uma das principais regiões, sob o domínio mogol, a produzir este tipo de mobiliário, enviando-as diretamente para a Europa através das suas cidades portuárias, Cambaia e Sinde, sendo, contudo, a sua maioria enviada para Goa, destinando-se às altas chefias portuguesas durante a sua estadia no Oriente e/ou para exportação.
O formato de mobiliário produzido segue o modelo europeu, adaptado pelos artesãos indianos às exigências da clientela europeia[3], maravilhada com os materiais decorativos locais. Estas peças adquirem um caráter portátil devido à necessidade das constantes deslocações dos proprietários e ao caráter provisório das suas estadias no continente asiático.
É evidente o sincretismo estético, técnico e funcional, entre as culturas portuguesa e do Indostão. «Em nenhuma outra disciplina o Oriente e o Ocidente se fundiram de forma tão homogénea, penetrando-se o utilitarismo de raiz europeia e as técnicas e decoração próprias de cada região da península indostânica, formando-se desse modo famílias estéticas distintas»[4].
Hugo Miguel Crespo
Bibliografia:
CRESPO, Hugo Miguel, A Índia em Portugal, um Tempo de Confluências Artísticas (cat.), Porto, Blueboook, 2021.
DIAS, Pedro, Mobiliário Indo-Português, Moreira de Cónegos, Imaginalis, 2013.
DIAS, Pedro, Índia, Artes decorativas e iconográficas, Vol. Arte de Portugal no Mundo, 11, Lisboa, Público, 2008.
DIAS, Pedro, História da Arte Portuguesa no Mundo - O Espaço Índico (Séculos XV-XIX), Vol. II, Lisboa, Círculo de Leitores, 1999.
JAFFER, Amin Luxury Good from India: The art of the Indian Cabinet Maker, Londres, Victoria and Albert Museum, 2002
[1] Cf. DIAS, Pedro, Mobiliário Indo-português, Moreira de Cónegos, Imaginalis, 2013, p. 115
[2] Cf. CRESPO, Hugo Miguel, A Índia em Portugal, um Tempo de Confluências Artísticas (cat.), Porto, Blueboook, 2021, pp. 27-28
[3] Cf. Dias, Pedro, Índia, Artes decorativas e iconográficas, Vol. Arte de Portugal no Mundo, 11, Lisboa, Público, 2008, pp. 115-120; Jaffer, Amin, Luxury Good from India: The art of the Indian Cabinet Maker, Londres, Victoria and Albert Museum, pp. 9-13
[4] Dias, Pedro, História da Arte Portuguesa no Mundo - O Espaço Índico (Séculos XV-XIX), Vol. II, Lisboa, Círculo de Leitores, 1999, p. 324
Construído em teca coberta com folha de ouro, o escritório é integralmente revestido por placas polidas de carapaça mosqueada de tartaruga, provavelmente da tartaruga-de-escamas ou tartaruga-de-pente (Eretmochelys imbricata), atendendo às manchas acastanhadas sobre um fundo translúcido alaranjado[2]. As placas são fixas à estrutura por cavilhas, em tartaruga, com molduras em osso, também com o mesmo tipo de fixação.
Em cada face, a placa central é retangular, limitada por friso com reticulado geométrico em osso, teca e ébano, delimitado por banda mais larga em osso. Encontra-se envolvida por oito placas também retangulares, separadas por filetes de osso. A composição termina em moldura em osso, ébano e teca, desenhando reticulados cadenciados, com filete em osso periférico. O tardoz, embora com o mesmo tipo de decoração, difere no número de placas de tartaruga e sua disposição (10).
O interior da tampa de abater possui uma decoração semelhante às anteriores. O escritório apresenta sete gavetas, simulando nove, de dimensões variáveis, distribuídas por três níveis e que se subdividem, no seu interior. As frentes são decoradas com placas de tartaruga, e os entrepanos revestidos a filete de osso. As placas de tartaruga estão emolduradas por cercaduras de osso e ébano, tendo cantoneiras em osso e os puxadores, em formato de botão, do mesmo material. São exceção o gavetão superior e a pequena gaveta mediana do renque inferior.
No interior dos compartimentos, as arestas são decoradas com o mesmo tipo de cantoneira em osso.
As ferragens, em prata, incluem o espelho de fechadura recortado e gravado com decoração floral, cantoneiras em prata recortada e gravada com flores-de-lis fixas por balmázios de prata, dobradiças, bem como gualdras laterais nas ilhargas.
Escritórios semelhantes foram produzidos na Índia, em Guzarate e noutros centros de produção ao longo da costa ocidental indiana, e no Ceilão (atual Sri Lanka). Guzarate foi uma das principais regiões, sob o domínio mogol, a produzir este tipo de mobiliário, enviando-as diretamente para a Europa através das suas cidades portuárias, Cambaia e Sinde, sendo, contudo, a sua maioria enviada para Goa, destinando-se às altas chefias portuguesas durante a sua estadia no Oriente e/ou para exportação.
O formato de mobiliário produzido segue o modelo europeu, adaptado pelos artesãos indianos às exigências da clientela europeia[3], maravilhada com os materiais decorativos locais. Estas peças adquirem um caráter portátil devido à necessidade das constantes deslocações dos proprietários e ao caráter provisório das suas estadias no continente asiático.
É evidente o sincretismo estético, técnico e funcional, entre as culturas portuguesa e do Indostão. «Em nenhuma outra disciplina o Oriente e o Ocidente se fundiram de forma tão homogénea, penetrando-se o utilitarismo de raiz europeia e as técnicas e decoração próprias de cada região da península indostânica, formando-se desse modo famílias estéticas distintas»[4].
Hugo Miguel Crespo
Bibliografia:
CRESPO, Hugo Miguel, A Índia em Portugal, um Tempo de Confluências Artísticas (cat.), Porto, Blueboook, 2021.
DIAS, Pedro, Mobiliário Indo-Português, Moreira de Cónegos, Imaginalis, 2013.
DIAS, Pedro, Índia, Artes decorativas e iconográficas, Vol. Arte de Portugal no Mundo, 11, Lisboa, Público, 2008.
DIAS, Pedro, História da Arte Portuguesa no Mundo - O Espaço Índico (Séculos XV-XIX), Vol. II, Lisboa, Círculo de Leitores, 1999.
JAFFER, Amin Luxury Good from India: The art of the Indian Cabinet Maker, Londres, Victoria and Albert Museum, 2002
[1] Cf. DIAS, Pedro, Mobiliário Indo-português, Moreira de Cónegos, Imaginalis, 2013, p. 115
[2] Cf. CRESPO, Hugo Miguel, A Índia em Portugal, um Tempo de Confluências Artísticas (cat.), Porto, Blueboook, 2021, pp. 27-28
[3] Cf. Dias, Pedro, Índia, Artes decorativas e iconográficas, Vol. Arte de Portugal no Mundo, 11, Lisboa, Público, 2008, pp. 115-120; Jaffer, Amin, Luxury Good from India: The art of the Indian Cabinet Maker, Londres, Victoria and Albert Museum, pp. 9-13
[4] Dias, Pedro, História da Arte Portuguesa no Mundo - O Espaço Índico (Séculos XV-XIX), Vol. II, Lisboa, Círculo de Leitores, 1999, p. 324
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