Escritório Namban ou Nipo-Português , Japão, período Momoyama
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Chama-nos logo a atenção a tampa do escritório, onde se destaca reserva de grandes dimensões polilobulada, que encerra cena vegetalista e onde sobressai um exuberante casal de tartarugas (Kame) - animais que viveriam até uma idade muito avançada, crescendo-lhes uma longa cauda branca que exalaria vapores capazes de criar joias sagradas[1] – e que apresentam carapaças com um padrão de hexágonos designado Kikko-mon, que teve origem no período Nara (710-794), com pássaros ou flores (Karahana) desenhados no seu interior.
Estes testudines, que emergem da água, estão ladeados por um frondoso acer palmatum ou bôrdo nipónico (Momizi) com um cuco (Hototogisu) pousado e uma laranjeira (Tachibana). O restante quadro é preenchido por círculos intricados, com as zonas de interseção preenchidas com madrepérola, desenhando uma estrela centrada numa pequena flor. Este interessante padrão geométrico vai-se repetir na frente do escritório. O todo – tal como as ilhargas e o tardoz - está delimitado por moldura larga periférica de círculos e semicírculos decorados com elementos florais estilizados sobre fundo de laca negra, intercalados com madrepérola decorada com pequenos quadrados desenhados a ouro.
A decoração da frente deste móvel está dividida em duas partes, ambas limitadas por uma cercadura e que correspondem ao contentor e à gaveta. Na parte superior, duas reservas polilobadas, cercadas por um friso de madrepérola e separadas por um exuberante espelho de fechadura. A da direita está ornamentada com duas codornizes (uzura) junto à planta da flor Gentiana (rindo), ambos símbolos associados ao Outono. A outra está preenchida com laranjeira (Tachibana) e, o que parece ser o rouxinol japonês (uguisu) - muito associado à prosa e poesia japonesa, o canto deste pássaro está relacionado com o Novo Ano, como se pode ler no capítulo Hatsune, no famoso Genji no Monogatari (O Conto de Genji)[2]. Por debaixo, gaveta a todo o comprimento decorada com um padrão geometrizado e escudete singelo.
Nas ilhargas, o campo é preenchido à direita por laranjeira e flor Gentiana e, à esquerda, pela árvore de Paulónia (Kiri), numa alusão à casa imperial nipónica e à Primavera. O tardoz é também decorado com um longo ramo de Paulónia.
O interior do escritório é lacado a negro. Na tampa, pérgola desenhada a ouro, onde cresce uma cameleira (Tsubaki), arbusto que simboliza o inverno no calendário floral tradicional japonês. A complementar este quadro, um gafanhoto (Korogi) - animal de estimação popular no Japão, muitas vezes representado em lacas – um grou (Tsuru), alegoria de longevidade, também associado ao Ano Novo e, mais uma vez, o cuco.
As montagens douradas a azougue estão repletas de motivos vegetalistas na sua decoração. A fechadura segue o modelo europeu de aldraba e o escudete é ovalado. Têm ornamentação incisa e contornos ondulantes.
O realce dado às tartarugas prende-se com o facto de nas tradições Hindu, Taoista, Confucianista e Budista, este quelónio ajudar à evolução do mundo. Dada a sua longevidade, é associado ao paraíso taoista, o Monte Horai e ao Palácio Aquático do deus-dragão, rei dos mares. São representados nos contos de folclore japonês como o de Urashima Taro, onde a tartaruga é a mensageira dos deuses, capaz de viajar entre os territórios subaquáticos e terrestres. Por outro lado, na arte japonesa aparece associada aos sete deuses da boa fortuna, facto que se traduz aqui pela ornamentação geométrica onde o casal está inserido, conhecido como “padrão das sete joias”, que se associa a estes deuses.
Sendo um belíssimo exemplar de arte namban, este móvel faz alusão óbvia às estações do ano. É ainda uma clara metáfora à vida e à morte, bem como às mudanças no sentido da vida, que se regenera e se transforma em cada estação.
A madrepérola utilizada é maioritariamente do tipo aogai, que emana um brilho azul-turquesa. Foi também utilizada a concha chogai, com um brilho mais esbranquiçado e iridescente.
À beleza evidente desta caixa, acresce a riqueza decorativa, que lhe confere um importante significado artístico-cultural. Profusamente decorada com o padrão das sete joias, que num contexto japonês é metáfora dos sete deuses xintoístas da boa fortuna (shichi fukujin)[3].
Bernardo Morais dos Santos
[1] Op. cit, BAIRD, Merrily, Symbols of Japan: thematic motifs art and design, Rizzoli International Publications, Inc., Nova Iorque, 2001, p. 168.
[2] Idem, p. 112.
[3] Cf. BAIRD, Merrily, Symbols of Japan: thematic motifs art and design, Rizzoli International Publications, Inc., Nova Iorque, 2001, p. 198.
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